A nossa vida vai sendo sempre feita de muitos projectos de outras vidas. Desses, se tivermos sorte, um torna-se real. E os outros ficam para trás, esquecidos ou lembrados de vez em quando. Às vezes há pena nesse recordar, outras apenas sorrisos, um abanar de cabeça, que tolos que éramos, que bom foi sonhar e acreditar naquelas coisas que construímos de ar.
Muitas das vidas que não somos, que sonhámos e não fomos por causa das voltas que dizem que isto dá, foram sonhadas com outras pessoas. Gente que já foi a nossa gente e que seguiu vida também por outros caminhos, vida por outras vidas. E essas pessoas levam com elas aquelas vidas que sonharam connosco e que também eram delas.
E às vezes, nesta ervilha que é o mundo, damos, sem querer, com a nossa vida, aquela que sonhámos, a ser vivida sem nós. Sem nós lá dentro, mas real e concreta e ali. E mesmo que a vida que é a nossa seja maravilhosa e que não a trocássemos por nada, há qualquer coisa dentro de nós que se parte. Deixa de ser nossa, aquela vida que não chegou a sê-lo. Que estava guardada na gaveta, onde de vez em quando íamos olhar para ela, pensar que bonitos sonhos que já tivemos.