É dizer que, quatro anos e meio depois, ainda acho, por milésimos de segundo, que vejo a minha mãe passar na rua. É dizer que fui má filha. Que não soube chegar a tempo. Mas também reconhecer que talvez não dependesse de chegar ou não, porque ela queria mesmo muito morrer.
É admitir que o meu relógio biológico quer muito outro filho mas eu não sei se estou preparada para passar mais dois anos sem dormir. Não sei se eu aguento, se o meu casamento aguenta. Não sei se quero, apesar de querer.
É falar da angústia em forma de bola na garganta que não me larga, deste encontrar-me aqui, outra vez dependente de um exame que decida toda a minha vida. Mesmo sabendo qual é o meu lugar, sabendo que o mereço e que seria incrível nele.
É assumir o peso a mais e a infelicidade que me traz. É enfrentar a verdade de que nada mudará se eu não quiser. E muitas vezes não saber se quero, se consigo, se.
É arrastar noites em claro, adormecer de madrugada e acordar com beijos pequeninos. E morrer um bocadinho por dentro sempre que me lembro que ele não vai ser meu para sempre. É cheirá-lo e enchê-lo de beijos e mimos e colo e cócegas para saber de cor cada célula, cada gene, cada átomo.
É esperar uma mensagem que não chega. É ter saudades de quem já não está, levado pela morte ou pelo desinteresse.
É olhar para dentro. É ser mais eu.
(em resposta ao repto dela)